Doenças raras // Narcolepsia // Testemunho real. Para ler e meditar
By Diana Costa - novembro 21, 2018
Hey thirties! Sejam bem vindas a mais um post. Na sequência de um post anterior sobre doenças raras, hoje é a minha vez de vos trazer mais um testemunho inspirador para que juntas possamos refletir e tomar como exemplo.
Na qualidade de portadora de uma doença rara, sei o quanto pode ser difícil a sua exposição e aceitação quando os seus sintomas não são visivelmente incapacitantes aos olhos das pessoas.
A Narcolepsia não é uma exceção desta dura realidade!
Conhecida clinicamente como Síndrome de Gelineau, esta é uma patologia do sono geralmente caracterizada por sono excessivo e incontrolável com a agravante da perda de força muscular (Catalepxia) perante emoções fortes ou simplesmente por agravamento da doença. Ainda associado vêm as alucinações e a paralisia do sono, que são extremamente esgotantes, tanto a nível físico como mental. É incurável e afeta essencialmente o cérebro e os músculos. Apesar de ser uma doença progressiva pode ser estabilizada e ter os seus sintomas amenizados com o auxílio de medicação.
Os sintomas são facilmente confundidos com procrastinação e preguiça acabando por ser mal julgados pela sociedade devido à sua incompreensão, o que traz grande sofrimento e sentimento de culpa e incapacidade a quem com eles convive.
É sobre todo este enredo a que vos introduzi que a nossa querida Alice (nome fictício) nos vem falar, dar o testemunho de todo o processo de diagnóstico e descoberta da doença e como convive com ela diariamente.
Imagem retirada do Google
Diagnostico:
Síndrome
de Gelineau – Mais conhecida como Narcolepsia, autoimune, rara, sem cura.
Estado:
Inicial,
em progressão.
Áreas
afectadas: Cérebro e músculos.
Causas:
Nível
reduzido do neurotransmissor, hipocretina. Morte de células, origem desconhecida.
Sintomas:
Sonolência
diurna excessiva, paralisia do sono, alucinações, cataplexia (perda do tónus
muscular), falhas de memória, dormência mental, dores musculares.
Estado
avançado: Acidentes e quedas.
"Tudo começou quando tinha cerca de 20 anos de idade,
surgiu o primeiro ataque, na madrugada a paralisia do sono tomava conta do meu
corpo, onde só conseguia mover os olhos, ouvia nitidamente um rosnar, era a
minha mente a pregar-me partidas.
Foi a primeira vez que deu o alerta, mas como se diz, todas
as pessoas experimentam uma vez na vida a paralisia do sono.
Estabilizou até aos meus 23 / 24 anos, onde surgiram
duas paralisias do sono em duas noites seguidas, acho que estas foram sem
alucinações, não me recordo.
Consultei a minha médica de família, onde foi-me feito
um exame e diagnosticado hérnias, sim fiz uma TAC à coluna e acusou hérnias.
De facto, eu não ligava aos sintomas que o meu corpo
manifestava, excesso de sono, sentava-me no autocarro adormecia, sentava-me
numa mesa de café adormecia, simplesmente ignorei.
As paralisias do sono estabilizaram até aos meus 30
anos de idade, onde sofri um grande choque emocional, e aí foi em pico.
Passava semanas que tinha a paralisia do sono todas as
noites, várias vezes seguidas, o meu corpo doía após conseguir desmobilizar, a
minha mente estava exausta, nem conseguia pensar direito, tudo ficava vazio.
Voltei a consultar a minha médica de família, e houve
a hipótese que eu poderia sofrer de crises de pânico, outras vezes, crises de
ansiedade.
Enquanto o tempo passava, as paralisias ficavam cada
vez piores, o sono cada vez era mais intenso, sentia as forças a irem embora, a
minha memória falhava...
O pior de tudo era os julgamentos preconceituosos que
sofria, não da minha família, mas sim de leigos, “és preguiçosa”, “só sabes
dormir”, “tens é falta de peso”, “se tivesses a minha vida não tinhas nada
disso” entre muitos outros julgamentos que muitas vezes me faziam chorar
compulsivamente e desesperar.
Cheguei a piorar da depressão que tinha conseguido
estabilizar com a ajuda do meu psiquiatra.
Até que, o sono se tornou o meu pior pesadelo, deitar
e dormir era um pesadelo, ser por vezes carregada pelo meu marido após as
paralisias era um pesadelo, as dores eram imensas, a exaustão estava instalada.
Aos 31 anos voltei a procurar a minha médica de
família. Não foi ela que me atendeu, mas sim uma médica da equipa dela e surgiu
o segundo diagnóstico: surtos psicóticos, entrei em pânico, não me enquadrava
no quadro clínico de surtos psicóticos, tudo porque tinha alucinações
auditivas. O chão sumiu debaixo dos meus pés, cheguei a casa completamente
transtornada e peguei em todos os livros de psiquiatria que tinha e procurei
que nem uma louca surtos psicóticos. Eu não me enquadrava no quadro clínico mas
ainda assim fui enviada para a psiquiatria por essa médica com urgência. Sim
com urgência, como se fosse uma doidinha!
Cada dia que passava piorava, mas nunca me dei por
vencida, as paralisias do sono já não me deixavam em pânico, pois eu tinha-me
preparado mentalmente que as alucinações era o meu cérebro a pregar me
partidas.
Imagem retirada do google
Tive situações engraçadas com as alucinações, desde me
mandarem calar e o meu cérebro dava a resposta “cala-te tu”, desde ver gatos
fofinhos, desde levitar (sensação incrível) e andar agarrada aos candeeiros a
fazer “weee” ao som de uma música super engraçada, mas era tudo a minha mente a
pregar-me partidas, eu estava deitada, imóvel sem me conseguir mexer.
Chegou o dia de ir ao psiquiatra, expliquei a
situação, todos os sintomas, e ele perguntou-me o que fazia ali, e eu disse
“diga-me o doutor”, bem… chamou a médica de doida e que eu tinha era que ir
para a neurologia, e assim foi, ele passou a carta para ser enviada para a
neurologia.
Eu estava exausta de diagnósticos, de andar de
especialidade em especialidade e ninguém me dava uma resposta conclusiva sobre
o que eu tinha. Os sintomas pioravam, mas nunca desisti, nem mesmo quando tinha
que andar agarrada ás paredes com as dores após os ataques, nunca desisti
quando estava exausta, eu nunca desisti quando me deitavam para baixo com
palavras medíocres…
Quando fui à consulta da neurologia, posso dizer que
apareceu um anjo na minha vida, embora tenha dado inicialmente epilepsia, fui
fazer exames mais específicos.
Essa neurologista fez de tudo, mas de tudo ao que
estava ao alcance dela para saber o que eu tinha, e reencaminhou-me para a
minha atual neurologista mas da especialidade medicina do sono. Foi aí que isto
tudo que tinha ganhou finalmente um nome: Narcolepsia. Fiz mais exames, Polissonografia
com EEG (Electro Encéfalograma) completo e um teste de latências múltiplas e
olá Narcolpesia, finalmente havia diagnóstico certo para tudo o que tinha.
Infelizmente comecei a ter cataplexia ligeira, a
cataplexia é a perca do tónus muscular, onde caímos no chão como se tivéssemos
desmaiados, mas estamos conscientes de tudo o que está a acontecer. Em mim
perco ligeiramente a mobilidade das mãos e das pernas, não chego a cair, o meu
organismo ainda é durão.
Atualmente estou a iniciar a medicação, faço a minha vida
normal, trabalho, cuido da casa, da família, posso dizer que se era agarrada à
vida, hoje ainda sou mais, tenho alguns cuidados, pois estou a habituar-me a
esta nova vida, mas embora eu seja “edição limitada” como chamo à minha
condição neurológica, aprendi que, sou mais forte do que que pensava, consigo
fazer a minha vida normal e acima de tudo batalhei com todas as minhas forças."
Pode dizer-se que depois desta história fascinante a força de vontade é capaz de quebrar barreiras e ultrapassar obstáculos tidos como impossíveis.
A Alice é um excelente exemplo do meu pensamento "Sou eu que tenho a doença, não é ela que me tem a mim.". Mesmo após anos de exames e diagnósticos exaustivos ela nunca desistiu, nunca sucumbiu à doença.
Antes pelo contrário, demonstrou uma enorme força e poder interior transcendentes ao seu próprio corpo e acima de tudo continuou a lutar pela vida de uma forma apaixonante. É de facto uma pessoa incrível, uma amiga com o coração do tamanho do mundo, cheia de caráter único e personalidade forte, com uma alegria de viver contagiante.
Apesar de todas as dificuldades que enfrentou na vida e as limitações que a doença lhe foi causando, nunca deixou que a amargura e a tristeza lhe tomassem essa alma magnífica e resplandecente. Obrigada Alice pelo teu testemunho, por nunca teres desistido de ti e por trazeres sorrisos e alegria diariamente a todos os que estão à tua volta!